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Reviravoltas do Universo

QAWWI – FANZINE DE FICÇÃO ESPECULATIVA – EDIÇÃO 1

Olá Tripulantes,

No ano passado anunciamos a abertura de submissões ao Diário de Uma Qawwi, com o intuito de partilhar com os leitores novas histórias. Esta a é primeira edição da Qawwi, uma fanzine eletrónica onde partilharemos histórias do fantástico e da ficção especulativa.

Nsta edição, apresentamos contos inéditos dos autores Adelino Albano Luís, Ana Charles e Bruno Areno. Eles nos trazem a fábula por detrás do surgimento de arco-íris, a história do Universo e a história de um homem que trocou o seu coração humano por um coração de papel.

Votos de boas leituras.

Um abraço interplanetário,

Virgília Ferrão

Diário de Uma Qawwi

Arcolino Pires

Quando as primeiras gotas timbilaram o chão da nossa aldeia, houve grande alvoroço.

― Está a “chover chuva” ― gritava-se.

As mamanas da aldeia, vestidas apenas de capulanas, saíram das palhotas carregadas de bilhas e seus corpos eram lindamente decalcados pela molha. Em suas bocas saíam as mais antigas e bonitas canções da nossa terra, numa alegria que pertence apenas às mulheres.

As crianças, sem roupa, corriam de um lado para o outro

― Chuva… Chuva… Chuva… ― Gritavam.

Os homens saudavam-se com calorosos abraços. Era o fim de uma espera que se fazia longa. Era o fim daquelas rezas silenciosas com olhares de súplica aos céus. Era o fim dos suspiros de triste esperança, de que

― Há-de vir… Está a procurar o caminho.

Porém, ao cabo de uma semana inteira de chuva que se fazia cada vez mais intensa, com suas trovoadas e relâmpagos que acendiam até o íntimo de cada um, os semblantes assumiram outras fisionomias.

― A água esqueceu-se de parar.

Sofremos tanto com a seca e, agora, é para sofrermos com a chuva?

Começaram a surgir relatos de palhotas, tão bem maticadas, destruídas pelas águas; Currais arrasados: os bois, tão donos de tamanhos, eram arrastados pela fúria das águas; E o pior

― O rio está vindo!

O rio, com a gula das águas, ambicionava outros tamanhos. Invadindo o interior das machambas, casas e o interior das pessoas, como se vasculhasse alguma coisa que lhe pertencia.

Todos nós saímos das nossas casas e fomo-nos abrigar na única casa da aldeia feita com blocos queimados. Dentro dela, no tempero do desespero, começaram a rolar teorias, afinal, em África as desgraças nunca vêm com os seus próprios pés. Havia, certamente, alguma ofensa contra os espíritos.

― Enterraram algum bebé sem cerimónia.

― As traições estão demais ― e acrescentou, ― muito sexo sem nexo.

― Alguém casou sem lobolo.

E muitas outras teorias foram aventadas. Nada poderia ser provado ou, até lá, já teríamos sido varridos pelas águas.

― Eu tenho a solução.

Quem? O louco? Quando até aos loucos é concedida palavra, é porque a situação é mesmo de desespero.

Todos olharam para ele como se portasse uma mensagem divina. Os olhos eram de renovada esperança, como se o facto de ter sido louco a vida inteira fosse para nos salvar daquelas águas e daquele rio que se aproximava. Não é verdade que todos os Messias do mundo sempre foram vistos como loucos? Por que com o Arcolino Pires seria diferente?

― Temos de varrer as águas. ― Disse, justificando assim a vassoura de palha que tinha nas mãos, até então ignorada por todos.

― Acho que lááááá nos comandos se descomandou. Precisamos varrer as águas e deixar alguém de guarda para isto não voltar a acontecer.

Falava com tal convicção que parecia uma solução óbvia. Mas só para ele. Para nós era claro: estávamos diante da nossa morte e ninguém nos poderia salvar.

Os olhares, desde as crianças aos velhos, transmitiam o mesmo medo, preocupação e desilusão. Afinal, toda morte é sempre prematura.

― Eu vou, verão o meu sinal nos céus. ― Era, uma vez mais, o Arcolino Pires.

Alguém, sem sucesso, tentou agarrá-lo para que não saísse da palhota onde nos havíamos acumulado. Era a casa mais bem construída da aldeia e seria a última a desabar.

Lá fora as chuvas continuaram intensas, com seus raios e trovoadas. Mais uma vez soou a frase:

― Sofremos tanto com a seca e, agora, vamos morrer com as águas.

Os velhos entreolhavam-se, tristonhos. Nem mesmo a lembrança dos tempos de estômagos e celeiros fartos, os podia consolar. Nesses tempos em que se bebia para celebrar a vida e se somava mulheres e mais mulheres, pois, naquela zona, isto era sinónimo de riqueza. Depois veio o tempo de seca severa. E as cerimónias sucederam-se: primeiro na pequena igreja de caniço deixada pelos missionários e, depois, nas sombras das árvores sagradas. Insatisfeitos com a demora da resposta, levamos os batuques, rezas e canções cerimoniais para o mais próximo possível dos ouvidos dos nossos antepassados: o cemitério tradicional. E lá a aguardente era quase um suborno: despejávamos umas gotas em cima das campas e dizíamos:

― Mandem chuva que nós damos mais nipa.

Tudo isto eram formas de namorá-los para ver se aceitavam enviar algumas gotas de chuva.

― Já nem precisam ser gordas… bastam que sejam gotinhas, meros pingos.

Desses que só servem para mostrar que ainda não se esqueceram de nós. Os céus, porém, respondiam com mais calor e, com ele, a fome e a miséria.

A seca foi tão severa que as pessoas desenterravam as sementes nas machambas, já murchas, para pôr nas panelas. Outros morreram por colocar na panela raízes incomestíveis, dessas que só são visíveis aos olhos da fome. É como diz o ditado: O que mata não engorda… ou será o contrário? Bom, eu…

― A água está ireeeee!…― Gritou alguém, para o silêncio dos que já se tinham adiantado para os choros.

Admirados, saímos da casa e tudo a volta tinha virado uma planície, pasto das águas. Mas é como diz Isaú Meneses, cantor largamente admirado naquela aldeia:

― Enquanto haver vida, há esperança[1].

Mas o que nos chamou mais a atenção foi o que estava pendurado nos céus, como se alguém, com uma grande vassoura, tivesse varrido as nuvens em formato de um arco com diversas cores. Era o sinal. Não havia dúvida:

― Foi obra de Arcolino Pires… Ele salvou-nos …disse que mandaria um sinal…

Gratos, saímos pelas aldeias vizinhas espalhando o feito do Arcolino Pires, o nosso salvador. E a informação voou.

Da boca do povo, porém, e com o tempo, Arcolino Pires começou a ser chamado de Arco-íris. Para nós não importa, desde que, após as chuvas, olhem para o sinal nos céus e saibam que tem alguém de guarda, cuidando de nós, impedindo que as águas nos devorem.


[1] Isaú Meneses, esperança. Álbum esperança. 1999.

Por Adelino Albano Luís

Adelino Albano Luís nasceu em 1998 em Chimoio. Licenciado em Filosofia pela UEM. É autor da obra ″Cronicontos da Cabeça do Velho″ (2022), prémio literário Calane da Silva ⁄ Alcance Editores (4ª edição- 2021). Conquistou o primeiro lugar do concurso de Crónicas da 1ª edição da Feira de Livros da Beira (2021); Conquistou o primeiro lugar do concurso literário Dia mundial da Língua Portuguesa: estórias pandémicas e foi finalista do prémio fundação Fernando Leite Couto (2022), com a obra Estórias trazidas pela Ventania. Participou em algumas antologias, com destaque para ″Espíritos Quânticos: uma jornada por histórias de África em ficção especulativa-Diário de uma Qawwi (2022) com o conto ″O Caçador de Elefantes″

O Mundo Distante em Nós

Quando a criação estava pronta, o SENHOR do Universo disse para a SUA companheira e seus descendentes imediatos: Façamos, agora, no planeta Terra, um Ser à nossa imagem e semelhança!

Como assim, o Homem não foi o primeiro a Ser criado por Deus? Já existiam outros planetas antes de Terra? Há quanto tempo?

Há mais de 40 milhões de anos o Arcanjo Miguel foi enviado à Lamúria para preparar o planeta Terra para um novo Ser que o habitaria, o Homem. Antes disso, Lamúria era somente habitada por seres hominídeos que nunca saíam das cavernas.

E onde andam esses hominídeos?

Ainda vivem nas cavernas. Mas, antes, deixe-me continuar a história.

O SENHOR do Universo vendo, através da SUA imaginação, que a VIDA para além dele seria fantástica, projectou, a partir da SUA mente, uma companheira para o seu lado oposto, de forma a complementá-lo. Tendo gostado dessa projecção, amou-a profundamente com o seu Espírito Puro e Invisível. Vendo que a VIDA dos dois era maravilhosa, o SENHOR enviou a SUA Centelha Divina para a SUA companheira, que concebeu o SEU UNIGÊNITO. ESTE possuía as mesmas caracteristicas dos seus progenitores.

Vendo ELES que o que criavam e projectavam através da sua mente era bom, decidiram projectar outros seres com espírito puro, que pudessem fazer companhia ao UNIGÊNITO, na nona dimensão.

Esses seres são aqueles que nós conhecemos como Anjos. Arcanjo Uriel, Gabriel, Miguel e Rafael são os mais conhecidos.

Mas existe, também, o Lúcifer, que dizem ser o Anjo mau!

Sim, é verdade, mas isso é assunto para outro dia. Hoje eu quero-me debruçar sobre o papel destes 4 anjos que mencionei,especificamente sobre o papel do Arcanjo Miguel.

Este anjo, além de ter um papel de liderança na protecção dos Portais Divinos, tem, também, o papel de liderança na criação e protecção dos novos mundos.

É por isso que a ele foi designada a tarefa de preparar o Planeta Terra para a recepção de um novo Ser: o Homem.

O Homem foi projectado nos céus e trazido para a Terra assim que o Arcanjo Miguel criou todas as condições para que o novo Ser nela habitasse.

Os pretinhos são os nossos ancestrais, eles foram os primeiros a viver em África. São os pais dos lemurianos. Os lemurianos eram homens belos, altos, atléticos e donos de uma inteligência sublime. Eles dominavam a tecnologia 5D e tinham a capacidade de se transmutar para diferentes formas físicas e de se deslocarem entre 2 dimensões diferentes ao mesmo tempo. Dominavam a matemática, a física quântica e a genética.

Depois de muitos milhões de anos transformando o planeta Terra naquilo que hoje é, eles começaram a ficar, por um lado, aborrecidos com a mesmice em que viviam e, por outro, arrogantes. Assim, começaram a desafiar as Leis Universais fazendo experimentos com outros seres humanos e não humanos através da manipulação genética.

Vendo que isso era desastroso para o projecto desenhado para o Homem, o SENHOR decidiu afundar a Lemúria depois de escolher uma família que, apesar de todos os poderes, nunca tinha agido contra as Leis Universais.

̶  Noé é a família?

̶  Ai como és esperto, sim! 

̶  Noé foi o escolhido, por isso, graças à sua boa índole, hoje existimos.

̶  Tenho a impressão de que nós e os lemurianos somos parentes.

̶  Por quê?  ̶  Quis saber, entre risos.

̶ Veja, como eles, somos inteligentes, ambiciosos, egocêntricos e gostamos de manipular geneticamente.

̶  Pois! É verdade e preocupante!

Depois da Lemúria veio a Atlantis. Depois da Atlantis veio a Amafrica, em que os índios, celtas, egípcios, maias, aborígenes viveram (e ainda vivem índios, egípcios e aborígenes).

̶  E os aborígenes são mesmo gente?

̶  Que pergunta! Claro que o são. Por que fazes essa pergunta?

̶ Porque num grande relatório que os ingleses fizeram para a rainha deles, eles afirmaram categoricamente que a Austrália era uma terra linda que parecia um paraíso. Com plantas lindas, animais exóticos e com uma paisagem como um conto de fadas, mas sem nenhum ser humano!

̶ Olha, é óbvio que esse relato não contou toda a verdade, pois os aborígenes são pessoas que ainda existem um pouco por toda a Austrália. Basta lá ires que os verás. É verdade que constituem cerca de 1.8% do total da população australiana, mas existem.

̶  E a Telos, será que existiu mesmo?

̶  Áh, a Telos…a telos não existiu, EXISTE.

̶  Existe? Como assim, como podes afirmar com tanta certeza? Se existe, onde ela está?

̶ Sim, a Telos existe, existe em todo lado, no mundo subterrâneo, debaixo de cada montanha com formato de animal, planta ou Homem.

̶  A sério? Então quer dizer que debaixo do Monte Mtuquê em Cuamba, da Cabeça do Velho em Chimoio, Ayers Rock na Austrália ou Montanhas Azuis em Montana está a Telos?

̶  Bingo!

̶  Uau! Então me explica, o que é a Telos?

̶  Lembra que te falei dos hominídeos?

̶  Sim.

̶  Pois, eles habitam a Telos, junto de seres angelicais, numa sociedade tão avançadaque a nossa mente humana, tal como a conhecemos, não consegue alcançar. Veja que nós ainda vivemos e concebemos o mundo na 3ª dimensão, mas a Telos já está na 5ª dimensão. Mesmo estando aqui no planeta Terra, os povos que lá habitam tem um sentido de cooperação e colaboração tão grande que nada falta a ninguém. Todos têm o que precisam, todos são felizes e vivem uma vida alegre, de riqueza e de prosperidade. Tudo baseado no AMOR incondicional e regidos por uma Lei e Ordem que agrada a todos.

̶  Deve ser o Paraíso.

̶  É sim, o Paraíso.

̶  Me conta mais avô, como fazemos para viver nesse paraíso?

̶  Ah menino isso é para ser contado na próxima roda à volta da fogueira… e só trazeres uma garrafa do melhor vinho tinto que há.

̶  Então esse é o acordo? Uma garrafa do melhor vinho tinto por uma história?

̶  É sim.

 ̶  Combinado!

̶  Combinado.

Por Ana Charles

Ana Francisco Charles, conhecida por Anita # Mai Nkulo nos meandros da família, adopta o cognome de Mai Patti, nome dado pela sua mãe desde pequena pela sua forma despreocupada de andar. Nasceu na Vila de Manica no ano de 1966. O seu gosto pelas letras vem desde a tenra idade de 4 anos quando no lugar de brincar com bonecas preferia ler livros como a colecção de aventuras de Anita e mais tarde romances de Corin Telado. Depois disso o seu gosto pela leitura só cresceu e estando no ensino secundário teve a oportunidade de escrever e publicar alguns poemas no Diário da Beira. Profissionalmente, é mais conhecida por Ana Charles, Médica Generalista com especialidade em Saúde Publica pela Universidade Eduardo Mondlane. Com Mestrado em Saúde Publica na área de Promoção para a Saúde pela Universidade de Queensland na Austrália. Adora viajar e fazer passeios longos na natureza. Fazer viagens internacionais principalmente para países onde o clima é seco e frio e interagir com povos e culturas diferentes é algo que a encanta muito. Aprecia paisagens montanhosas e a vida no campo. A ajuda ao próximo é algo que pratica com regularidade através de pequenos gestos como doações regulares a instituições de caridade como centro de apoio à velhice, igrejas ou centros de refugiados. Mãe de 5 filhos, Ana tem uma filha biológica e 4 enteados, avó de 3 meninas e 1 menino.

Coração de papelão

Nascera num país não apropriado. Não passava de um Zé ninguém. Sem estatuto social. Adalberto era uma grande aberração aos olhos de quem o via. Ninguém se dava ao trabalho de cumprimentá-lo. Seu problema: ser cauteloso demais. Talvez, demasiado amoroso, atencioso e paciente num mundo que era urgente. Na verdade, Adalberto era o único homem que nutria temor na cidade-sem-medo. Estudava o inimigo e conhecia as suas fraquezas.  E isso ia contra a lei daquela cidade. As pessoas da cidade-sem-medo não eram cautelosas.

Quando se recrutavam jovens para os campos de batalha, Adalberto era sempre ignorado.

— Precisamos de homens não inteligentes, mas sem medo, e tu, jovem, és a personificação do medo — Diziam em gargalhadas, todas a vez que o jovem homem se candidatava.

Numa dessas manhãs de recrutamento, Adalberto insistiu tanto que venceu. “Milagre”, pensou ele, deixando escapar um sorriso vitorioso. A sua velha mãe, que jamais sentira medo na vida, ficou felicíssima. Aqueles olhos que outrora se viram melancólicos, ganharam vida.

— Finalmente o meu filho perdera o medo, tornar-se-á comum, assim como nós — Dizia ela alegre enquanto os militares tiravam o jovem aos empurrões de dentro da sua casa. A mãe derramou nenhuma lágrima, afinal, não possuía medo algum, muito menos previa os possíveis riscos que o filho correria no campo de batalha. Estava Felicíssima, pois não mais seria a maior aberração entre as amigas. A velha saiu de casa gritando aos ventos: O meu filho finalmente perdeu o medo!

Depois de uma semana, um general bate à porta da velha, e ela fica pasma:

— O que significa isso?— pergunta endireitando os óculos, prestes a tombarem sobre o chão húmido.

— Sinto muito, Senhora— responde o general aborrecido. — Esse filho que a Senhora tem é um pau torto e torto morrerá. O temor sobre o seu Ser é tanto que passava horas a tentar estudar o inimigo— Fixou os olhos nos da velha e acresceu — Ele diz que é necessário estudar o inimigo para conhecer as suas fraquezas. Ele ainda disse que devemos ter medo, medo de perder a nossa nação, a nossa cultura, o nosso povo. Fique com ele.

O general empurra-o de volta para os braços da progenitora.

A velha ficou ali, perplexa, imóvel. Aqueles sentimentos ataram-lhe o corpo. Virou-se para o filho:

— Essa cabeça que não regula, não te vai ajudar. Ninguém te quer por perto. Mas também quem te iria querer? És muito cauteloso, fazes as coisas, pois fazes, mas só depois de muito ponderares. Tenha coragem, filho, faça-o de olhos fechados, Adalberto! — Dizia a velha— Aja por instinto, assim como os grandes animais ferozes.

Passado alguns dias, Adalberto sai a rua. Com os olhos presos no chão, escuta murmúrios e insultos ao vento. Afinal, jamais alguém tinha sido expulso do campo de batalha por medo. Muitos morriam. Nem metade deles voltava à casa. Exausto de semear os olhos sobre a terra, Adalberto ergueu o rosto. Mas, de imediato, encolheu-se, embaraçado. Não era medo dos falatórios do povo, mas sim do seu próprio coração. Encantara-se com a mulher diante de si. Estava apaixonado, ela acabara de roubar-lhe o coração.

Pensara em falar-lhe dos seus sentimentos naquele mesmo instante, mas preferiu aguardar e entender melhor o sentimento que o cativara.

Depois de semanas, vai ao encontro da mulher, exprime o seu interesse, mas ela desafia-o, dizendo que só o aceitará depois que perder o medo.

Cabisbaixo, Adalberto faz-se a rua, e quando decide erguer os olhos para contemplar a cidade que dele tem nojo, nota uma oficina. No interior, por detrás do balcão, está um idoso, de óculos com grandes lentes e mal de tossir.

— O que o senhor trouxe para que eu concerte?— questionou o velho, acendendo um cigarro.

— O meu coração.

— Ah!— exclamou o velho— Teria que o deixar comigo por alguns dias.

— Mas eu não posso viver sem um coração— respondeu Adalberto.

O velho direccionou-se para um armário alto e de lá tirou um coração de papel. Entregou-o a Adalberto, dizendo:

— Use-o enquanto conserto o seu.

— Funciona perfeitamente? É igual aos demais?

— É um coração de papel.

Da oficina, Adalberto saiu com um coração de papel novinho em folha. E já não era o mesmo. Dali em diante, passou a ser igual aos outros. Já não tinha interesse na mulher que vira na rua. Interessava-se por todas que via passar. Fora-se a cautela. Passara a ser violento. Metia-se em brigas nas ruas, roubava e ninguém o criticava. Afinal, era igual a todos.

Um dia passou em frente da oficina. Decidiu entrar.

— Deixei um coração aqui, há anos.

— Prontos, não se preocupe, lembro-me perfeitamente de si. — O homem retirou do armário um coração coberto por um pano branco.

— Consertou?

— Não. — Respondeu o velho ajeitando os óculos.

Adalberto sentou-se na poltrona da oficina e suspirou profundamente.

— O desconserto deve ser maior.

— Nunca vi em toda minha vida, um coração tão perfeito, tão completo feito este. Ele não requer um reparo — Explicou o velho estendendo-lhe o coração. Adalberto recusou-o.

— Para o senhor talvez seja perfeito, mas para mim e para a minha gente esse coração só traz decepções, desigualdades e prejuízos. Para o povo, o coração de papel, esse sim é perfeito.

Levanta-se da poltrona e diz:

— Gostou do coração? Fique com ele, eu ficarei com o de papel.

— Mas não existe, Senhor, coração tão perfeito quanto o seu!— Insistiu o idoso desesperado. Adalberto aproximou-se do velho, agarrou-lhe as mãos trémulas e disse:

— Já lhe disse: para este país, para esta gente, esse coração não está bom. Gostou? Fique com ele. O coração de papel, sim, é perfeito.

Por Bruno Marquês Areno

Bruno Marquês Areno, nascido em Nampula, é autor de “Fotografias Feitas à Letras” e co-autor de livros como “O Estrangeiro”; “Olhares Negros”; “Poesia Brasileira”; “Água”; “Poemas do Eu”; “Alma de Mar”, entre outros.

Lançamentos!, Opiniões, Resenhas

Literatura | Encontro em Rosebank, de Lex Mucache – Opinião

Autor: Lex Mucache

Editora: Fundza

Idioma: Português

Sinopse

“Quando Audrey e Nomssa ultrapassaram a distância que mantinham nos primeiros encontros, rompendo a barreira turva da indecisão – as suas conversas passaram para lá da simples vida académica. Puseram de lado o jargão escolar. Já falavam das suas próprias vidas aberta e intimamente. A amizade consolidava-se a olhos vistos”

Duas grandes amigas.

Um homem apaixonado.

E uma decisão que muda dois destinos.

Opinião

Encontro em Rosebank é o mais recente trabalho do autor Lex Mucache, publicado pela editora Fundza, cujo lançamento está previsto para o dia 28 de Fevereiro de 2023, na cidade de Maputo. A narrativa tem como foco uma história de amor, mas não só. O empreendedorismo, a amizade e o crescimento pessoal são explorados nesta deliciosa história onde um homem em busca de um sonho, acaba se reinventado e descobrindo as suas verdadeiras ambições pessoais.

Por um lado, temos a história de amizade entre as sul africanas Audrey e Nomssa e por outro, temos a trama do protagonista moçambicano Hermes. Fascinado desde sempre pela famosa académica e bloguista Nomssa G’qola, Hermes decide um dia viajar para a África do Sul, com o objectivo de participar numa palestra ministrada por Nomssa, na esperança de poder conhecer pessoalmente esta mulher que tanto admira à distância. Algum tempo depois, em meio a várias peripécias, Hermes e Nomssa iniciam um romance virtual. No decurso deste processo, Hermes acaba também criando outros novos vínculos que pesam no seu desenvolvimento pessoal. O autor impressiona pela criatividade ao elaborar uma trama tão dinâmica quanto surpreendente no caminho encetado pelos protagonistas.

Sobre o espaço que ambienta a narrativa de “Encontro em Rosebank”, o autor que tem uma forma peculiar de pintar as paisagens com as palavras, nos apresenta um bom retrato da vida académica e de alguns debates que visam explorar a importância da história dos heróis africanos. O autor apresenta também uma imagem viva da cidade de Maputo e de algumas cidades sul africanas, abordando o quotidiano, a rotina das pessoas que viajam entre os dois países vizinhos, incluindo o drama de quem exerce o comércio informal, também conhecido como “mukheru”, caraterizado pela travessia das fronteiras para África do Sul, onde os comerciantes compram bens para revender nos mercados de Maputo. A propósito disto, o núcleo composto por Kiwanga e a família desta, desenvolve um papel relevante na narrativa, evidenciado a importância do empreendedorismo na vida dos moçambicanos. É de forma que podemos dizer que personagens como Kiwanga e Hermes, nesta ficção, trazem-nos uma certa representação do povo moçambicano.

A escrita de Lex Mucache revela-se leve e concisa, com diálogos bem construídos, embora em alguns momentos certas descrições pareçam demoradas. É uma leitura rápida e prazerosa, auxiliada pelo lindo e excelente trabalho de diagramação feito pela editora Fundza.

Em resumo, Encontro em Rosebank é um bom livro para sorrirmos e que vale a pena ser lido, pela mensagem que nos traz sobre o amor, a amizade e o desafio de nos tornarmos e nos fazermos humanos melhores.

❝e o que era a juventude sem esperança?❞

Sobre o autor

Lex Mucache é pseudónimo de Heráclito Alexandre Mucache. Nasceu na cidade de Maputo no ano de 1980. É professor e desenvolve actividades de leitura e escrita criativa nas escolas primárias. Autor do livro de contos «Asas Decepadas» (Kulera, 2020), obra finalista do Prémio 10 de Novembro de 2019. Tem obra dispersa em vários jornais e revistas.

A nossa classificação: 4.8 de 5 estrelas

Outras maravilhas humanas

PEDRO PEREIRA LOPES: UM ARTESÃO DAS PALAVRAS NA PROSA CONTEMPORÂNEA

Maiane Pires Tigre[1]

1. Maiane Tigre – Para além de uma produção literária destinada ao público infanto-juvenil, você também é estudado por possuir publicações dirigidas para o público adulto. Dono de uma escrita versátil, abrangendo a poesia, o conto, e, por fim, incluindo-se o romance, consideramo-lo um escritor multifacetado, primeiro porque é capaz de investir na hibridez dos gêneros, além disso, possui uma rica capacidade de inovar ao aderir às mais atuais tendências da prosa contemporânea. Comente tais inovações na linguagem, verificadas, por exemplo, nas obras Mundo Grave (2018) e A invenção do cemitério (2019), afinal predomina o completo abandono das regras gramaticais, no tocante ao registro de nomes próprios com letras minúsculas, no início dos títulos, dos parágrafos, e após o uso do ponto de continuação. Haveria, pois, uma estratégia estilística adotada à la Oswald de Andrade, resultante de um diálogo intertextual, na tentativa de reafirmar o seu ultramodernismo?

Pedro Pereira Lopes As primeiras versões de “mundo grave” e “a invenção do cemitério” obedeciam ao convencionalismo tradicional, isto é, à gramática da língua portuguesa como a estudei, como a assimilei. Acontece que durante a minha estadia em Pequim, onde estudava, eu redescobri parte da minha africanidade, o meu lugar num mundo fora de Moçambique, fora da África, onde eu era “o outro”. Esta tentativa de aproximação com a África fora de mim me fez partir em busca de uma ancestralidade que, por inocência, eu acreditava que a detinha, como algo que se pode possuir. É a coisa de Saramago de sair da ilha para conhecer a ilha.

Eu gosto de crer que, em termos de técnicas empregues na série (que chamei de “trilogia absurda das minúsculas” – envolve, ainda, o livro de poesia “mundo blue”), a base foi este “disruptivo” e grosseiro “regresso às origens”, à origem da literatura africana, à oratura. Então, o processo de narração funcionaria em um esquema instintivo, quase um fluxo de consciência, onde o narrador chega a duvidar de si e comete erros durante o processo de contação (acontece em “mundo grave”), ao mesmo tempo em que a linguagem se transforma em um instrumento abstracto e subjectivo dentro do livro, no papel, sem obedecer às normas da gramática. Assim, a mancha gráfica, os elementos da pontuação e a maiusculização, por exemplo, obedeceriam a uma espécie de democracia ou liberdade natural da narratividade, em que se estabelece a oratura. À volta da fogueira, não temos como distinguir um Pedro capitalizado de um “pedro” em caixa baixa. Do mesmo modo que não a história pode ter múltiplos narradores, ser interrompida, ser comentada ou não usar o formato tradicional de contação.

            De qualquer das formas, eu não inventei a roda, fui o primeiro em Moçambique a escrever três livros em caixa baixa, claro. Mas tens o Suleiman Cassamo, por exemplo, que domestica a língua portuguesa em “O regresso do morto”. Há o Saramago, o Valter Hugo Mãe e o Rui Nogar, cujo único livro em vida, “Silêncio escancarado”, é feito de minúsculas. E em nada isso anula a sua poesia única.

2. Maiane Tigre – Por que você decidiu seguir a proposta de ruptura no gênero, ao adotar o romance policial como forma estética sobressalente no tecido narrativo da obra mundo grave (2018), e o gênero microcontos em O livro do homem líquido? (2021). Quais são as suas fontes/influências, nacionais e estrangeiras?

Pedro Pereira Lopes Eu nunca me considerei prosador ou poeta. Questiono até essa coisa de “escritor”. Eu vivo em uma relação com as palavras, com a língua, com o exercício literário. Hoje, considerando a moda dos conceitos, eu diria que vivo numa “relação tóxica” com a coisa de escrever. Eu gosto de escrever. É uma relação sadomasoquista, de prazer e dor, o deleite de escrever e a dor pela busca do texto perfeito. Assim, fruto de tal inquietude, de tal desafio em busca desse preenchimento que resulta do prazer e da dor, eu nunca me contentaria em escrever somente um género literário. Eu costumo dizer que não sou bom em nada como não se pode ser bom em tudo. A ser escritor, no lugar dos extremos baseados em géneros, eu prefiro ser um “escritor experimentalista”, uma espécie em trânsito constante, em direcção ao inalcançável. No fim, gosto da surpresa, da possibilidade do impossível, da descoberta e da tentativa.

“mundo grave” começou como uma novela e fui perdendo o controle. Desenvolveu-se como um fungo. Eu queria criar um personagem como o “Jaime Bunda” do angolano Pepetela ou qualquer outro que eu tinha conhecido com Ruth Rendell, Conan Doyle ou uma história como as Sidney Sheldon. O resultado foi algo que eu chamo de uma mescla de policial com o insólito maravilhoso, meio noir, meio horror. E isso era algo nunca antes escrito em Moçambique. Eu sempre admirei o conto e já tinha publicado alguns. O conto é uma espécie de haicai do romance. E isso faz do microconto uma espécie de haicai do conto. E eu tenho uma paixão pelo haicai. Então, um dia eu pensei em escrever contos-haicais, que seriam pequenos contos escritos em três parágrafos, mesmo a imitar o haicai, que tem três versos. Foi quando descobri o microconto ou a micro-narrativa. Achei, dentro desse encanto, “O livro dos abraços”, do uruguaio Eduardo Galeano, e fiquei fascinado. Depois de mostrar um rascunho dos microcontos ao escritor António Cabrita, ele recomendou-me a leitura de “Histórias de Cronópios e de Famas”, de Julio Cortázar, que está disposto como um conjunto de pequenas narrativas. Assim nasceu “O livro do homem líquido”. Eu acho que, no final, imitei sem copiar. 

3. Maiane Tigre – A obra mundo grave (2018) é uma forte evidência de quanto você sonda, entre as fendas da miséria social, as intercorrências de um grave mundo, subitamente revelado no homicídio, pela corrução do caráter, na fraqueza do espírito de pessoas más. No enredo, o insólito, a violência e o trágico se cruzam nas encruzilhadas da urbe, que se retroalimentam da falência das instituições. Nesse ínterim, demonstra-se, com notável vivacidade, as periclitantes faces da cidade flagradas pelos olhos atentos do narrador, os quais transformam um simples acontecimento em um crime macabro, repleto de suspense e envolto em brumas de mistério. Quais são os verdadeiros papéis da cidade, do insólito e do grotesco nessa narrativa?

Pedro Pereira Lopes Sou fruto tanto do ambiente rural como da cidade. A minha vida adulta, em particular, é uma vida de cidades, de trânsitos. Diferente do campo, a cidade parece um organismo mecânico, um formigueiro de homens e edifícios e movimentos. Não estou a querer dizer que há mais vida na cidade, mas nela a vida é um produto processado, os comportamentos e as ideias são fruto de um sistema utilitário que se parecem com os supermercados. A cidade, a sua fluidez, a sua frieza e a padronização, está mais próxima da metáfora da composição “Another Brick in the Wall”, do Pink Floyd, ou da modernidade líquida, de Bauman. Mas todos nós gostamos das cidades, mesmo os que nela não habitam. Então, a cidade acaba por fazer parte das nossas vidas, como parceiras, como amantes. Deve ser por isso que costumamos fazer músicas e hinos para as nossas cidades. No meu livro, a cidade em si, a cidade de Maputo, é a personagem principal, uma personificação de Sodoma e Gomorra. O Valete, músico português, diz que “a cidade é o cemitério dos vivos”. E eu concordo.

O insólito e o grotesco compõem o maravilhoso moçambicano. Por exemplo, existem relatos de determinados falecidos que foram avistados a vender pão nas ruas de cidades que não eram as de sua proveniência; ter que fazer uma cerimónia aos espíritos dos antepassados na inauguração de uma estrada ou ponte, para que não aconteçam [muitos] acidentes; a perseguição e decapitação de indivíduos albinos para o seu uso em rituais de enriquecimento, entre outras situações. E fica a questão, qual é a diferença entre o real e o imaginário? Em contexto moçambicano, não é fácil ter conclusões. A noção de realidade ou de ficção acaba por ser uma conclusão relativa. A Paulina “explora” isso em alguns dos seus livros. Em o “mundo grave”, não fica claro o que é real ou fantástico. O leitor [moçambicano], na base do que acredita, decide como interpretar o que lê, ou seja, não existe nada de positivo no romance.

4. Maiane Tigre – A coletânea de contos a invenção do cemitério (2019) demonstra a sua ampla predileção por temas voltados ao hiper-realismo social, calibrando, em sua contística, a confluência do trágico, referente a situações vividas, com a poesia extraída do cotidiano. Portanto, a arquitetura dos contos é construída mesclando a linguagem ornamentada da prosa poética ao gume cortante da palavra, expressando a tensão prevalecente no âmbito das hierarquias de poder. Além disso, outra tendência na prosa contemporânea é a flagrante permanência de problemas sociais que atingem as camadas populares, e certos atores ainda reféns da violência urbana ou da distribuição desigual de poder na contemporaneidade. Nesse ínterim, poderíamos afirmar que o elenco de personagens que participam deste jogo ficcional constitui a representação do povo moçambicano que se equilibra entre o hiper-realismo e o sonho?

Pedro Pereira Lopes O Professor Etelvino Guila, da Universidade Eduardo Mondlane, diz que sim, que representa. Mas eu não sei se concordo ou discordo, não discuto com académicos. A minha proveniência é humilde. “Humilde” é uma palavra eufemística que significa pobre. Ela é usada em contextos em que o ex-pobre parece ter pejo de usar a palavra pobre ou pobreza. Eu não nego. A minha família era pobre. Onde cresci, onde me adentrou a escrita, existia apenas pobreza. Então, tudo o que conheço melhor é gente pobre, é a penúria, é a fome, gente pouco ou não escolarizada, a crença no divino, que ocasionaria uma vida melhor; a luta constante, a descriminação económica e a ausência de oportunidades. São essas as minhas representações. Uma outra professora escreveu que os meus personagens eram os que viviam “à margem da sociedade”, os marginalizados. Não existe isso de viver “à margem da sociedade”, a sociedade é uma e única, mas estratificada, dual, desigual. Eu jamais escreveria sob o ponto de vista de um personagem rico ou branco, por exemplo, porque escrevo o que é real, o que conheço. Se o que conheço é o que vivi, o que vivo – o sonho, a esperança –, então escreverei sobre isso, não importa o contexto, pode até ser em ficção científica. Esta é a minha forma de protesto.

5. Maiane Tigre – Como você percebe a importância  de O livro do homem líquido, finalista do prêmio Oceanos 2022, para o conjunto de sua obra,  e extensivamente, para consolidar o quadro da literatura moçambicana contemporânea? De que modo ela pôde projetá-lo no cenário literário internacional e, por tabela, também permitir à literatura de Moçambique reconhecimento além-mar?

Pedro Pereira Lopes Fui também o editor de “O livro do homem líquido”, pela Gala-Gala Edições, editora que fundei em 2020. Era apenas um livro de cansaço, de descanso, fruto do meu “experimentalismo”, que eu queria editar. Não achei que fosse a chegar tão longe, que fosse a ser, de alguma forma, importante. Não tenho a mania de gostar ou desgostar dos meus livros, talvez por serem sempre diferentes um do outro. Este “O livro do homem líquido” fez o seu próprio percurso. Talvez vá representar alguma coisa, mas nos últimos tempos, não costumo criar ilusões, gosto de ver o curso das coisas. O meu maior medo é perder a habilidade de escrever. Já tive ambições de ser conhecido internacionalmente, mas hoje só quero escrever, escrever para os moçambicanos, que é o meu público primário, e para quem aprecia o que já escrevi.

Por conta do Oceanos, escreveu-me uma agência de escritores de Londres, interessados no livro, pode ser que dê em alguma coisa. Mas antes da nomeação eu já tinha sido contactado, também, por tradutores para o inglês e francês. Passam-se anos, não devem ter gostado. Tenho, ainda, livros editados em Portugal e Brasil. Já sou internacional, para a minha mãe. Se o livro, finalista que foi, fizer o seu percurso, estarei satisfeito. Por enquanto, está somente disponível em Moçambique.

6. Maiane Tigre – Quem é o poeta Pedro Pereira Lopes? Como foi a experiência de ter publicado o livro “fatia fresca de lua nova (2023)” em parceria com um dos mitos da poesia moçambicana, o poeta Armando Artur? Por que a escolha do gênero de poesia japonesa, haicai, para escrever retratos da vida e da natureza de Moçambique?

Pedro Pereira Lopes Não existirá um poeta Pedro Pereira Lopes. Não compro a ideia. Existe um escritor que escreve poesia. Foi através da poesia que entrei na literatura, os primeiros textos que escrevi. Naquele tempo, sim, queria ser poeta. Mas depois vi que existiam muitos poetas em Moçambique. E se fosse para ser “poeta”, que fosse para fazer alguma diferença. Então decidi fazer poesia para crianças, pois não tínhamos poetas para crianças. Conheci a Cecília Meirelles por via disso. O Quintana. E existia um livro muito bonito do Rogério Manjate, “A casa em flor”. Fiz dois livros de poesia infanto-juvenil. Eu sei escrever poesia e fiz alguma poesia bonita e mágica para os pequenos.

O poeta Armando Artur é um amigo que fiz no último ano. Estamos muito próximos e veja que o convívio entre escritores, em Moçambique, ficou uma coisa horrível. Somos ambos da Zambézia, e não se trata de regionalismo, mas os escritores, sendo seres isolados, preferem não jantar com o inimigo. Um dia, à mesa do bar – ando sempre a bolar ideias – perguntei ao Armando, tendo como referência alguns dos textos de seus livros, se tinha consciência do haicai. E ele me disse que sim. Perguntei-lhe se os tinha em número suficiente para compormos um livro às meias. E gosto bastante desta coisa de dois autores de gerações diferentes estarem a colaborar em algo.

Eu achei o haicai por acidente, pela mão do Paulo Leminski, e percebi que existia, na sua composição e espontaneidade, um exercício necessário para a minha madureza como artista. O Armando acha o mesmo, que algo de supremo reside na simplicidade do haicai. É um livro de pequenos poemas, mas imenso na sua intenção.


[1] Doutoranda em Letras: Linguagens e Representações (UESC). Bolsista FAPESP. Membro do Grupo de Pesquisa GpAFRO: Literatura, História e Encruzilhadas epistemológicas. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2240-325X. E-mail: maiane.tigre@hotmail.com. Esta entrevista é o resultado parcial da minha tese de doutoramento orientada pela profa Dra. Inara de Oliveira Rodrigues (UESC) e co-orientada pela profa Dra Sara Jona Laisse (Universidade Católica de Moçambique – extensão de Maputo).

Autor Pedro Pereira Lopes

Resenhas

Convocatória de bolsas – residências artísticas

Caros Leitores e Escritores,

Foi recentemente divulgada uma nova convocatória de bolsas do Programa África MED – MAEC-AECID 2023-2024. Ao abrigo deste programa, existe a possibilidade da realização de residências artísticas com a bolsa de estágios (AFRICA-MED Prácticas). Não será necessário ter um título universitário, mas o requisito é identificar uma instituição espanhola de acolhimento. A Embaixada da Espanha em Maputo pode ajudar com o processo de identificação de instituições no âmbito do seu trabalho artístico.

O período de candidaturas é de 24 Janeiro a 10 Fevereiro de 2023.


Toda as informações disponíveis e respectivos documentos se encontram no site da agência espanhola AECID: 

https://www.aecid.gob.es/es/Paginas/DetalleProcedimiento.aspx?idp=466

A Embaixada convida ainda A participar da Videoconferência Webex – Sessão Informativa sobre as Bolsas PROGRAMA ÁFRICA MED 2023-2024 no dia 26 de Janeiro às 10 horas.

Link: 

https://mauc.webex.com/mauc/j.php?MTID=me4e47089659965a45ab7f8936a46b58d

Em caso de dúvidas, por favor contacte para consultas e mais informações através dos e-mails: becasmae@aecid.es (AECID) ou emb.maputo@maec.es (Embaixada).

Imagem: Residencia Literaria 1863.

Fonte: Nosdiario

Outras maravilhas humanas

ALDINO MUIANGA: O ESCRITOR DAS GENTES ENTRE A TRADIÇÃO E A SUBVERSÃO FICCIONAL

Maiane Pires Tigre[1]

1.Maiane Tigre – Poderia classificar o conjunto da sua obra em fases, entre a produção de contos, crônicas e romances, considerando a preponderância de temas, estilos, e as marcas da tradição ou de ruptura presentes em seus livros, de acordo com o período abordado, estendendo-se da década de 80 até 2022?

Aldino MuiangaComo em tudo, há sempre uma fase incipiente no início de qualquer empreendimento. Existe uma fase debutante, de timidez e receio de fazer “as coisas mal”. Sabido que é que uma primeira obra pode ser a perdição do seu autor, sempre usei de cautela, no início da minha carreira literária.  Esta começou como já o disse, por diversas ocasiões, com a produção de poesia. O projecto frustrou-se, porque toda a minha produção se perdeu em inundações, que assolaram o bairro onde residia. Era uma espécie de aviso que o meu caminho real não era o da poesia.

    Até 1987, nada escrevi que se chamasse literatura. O meu empenho residia em leituras, em exercícios de leitura, quase doentios. Queria escrever “bem”, veicular as minhas mensagens, de modo claro, profundo, penetrante e dissuasor. Durante as minhas leituras, apercebi-me que na literatura “moçambicana”, em geral, as referências que se faziam em relação à nossa cultura africana e (moçambicana em particular) eram, diria, exóticas, folclóricas, como curiosidades para consumo de turistas e curiosos. Isso causava-me muita estranheza e tristeza ao mesmo tempo. Pouco ou quase nada mesmo se escrevia sobre “nós próprios”, o que estava na essência cultural do ser moçambicano e africano.

     Obviamente que antes da declaração da independência do nosso país produziram-se obras de muita relevância, mensagens de protesto e de clamor pela autonomia nacional, pela afirmação de uma identidade que era sonegada pelo colonialismo. Foram obras que marcaram o nosso panorama literário até à independência nacional, como já o afirmei. Tive o privilégio de crescer num meio suburbano e de exercer actividades clínicas em meios rurais. A experiência que adquiri naqueles universos conferiu-me o caudal de informações de que necessitava para iniciar uma carreira literária que seria, em simultâneo, uma simbiose do que aprendera dos livros, e do que seriam os meus próprios conhecimentos sobre as culturas regionais e tradições específicas do indivíduo moçambicano e, por extensão do africano. Era um trabalho de pesquisa que decorria de um modo espontâneo, porque era natural. Absorvia as informações que colhia de diversas fontes: dos meus pacientes, de chefes e médicos tradicionais, companheiros de trabalho e demais fontes derivadas de convívios. Encontrava-me face a face com a verdadeira cultura do meu país, a vertente ignorada e escamoteada da nossa identidade.

     Assim surgiu a necessidade de proceder a uma rotura com as linhas oficias de fazer literatuta. Eu tinha a minha “literatura” por fazer, aquela que se fundamentava no real, isto é, na vida verdadeira do povo verdadeiro. Quis distanciar-me dos paradigmas correntes e seguir uma linha original: a de ser um porta-voz das estórias do povo, sem que isso signifique petulância ou complexo de superioridade. Sentia-me na obrigação de fazer “diferente”, e essa diferença começou a manifestar-se nas minhas primeiras publicações.

     Durante aquela fase incipiente consultei e partilhei alguns dos meus contos com autoridades na esfera literária de Moçambique. As primeiras impressões foram de espanto e de encorajamento. Todos diziam:  “explora esse veio”, “os temas são originais”, “a voz das nossas avós está presente nesses contos”, “os teus contos são autênticos nkaringanas”. Não tinha como vacilar. Prossegui a produção de contos com vigor, imbuído pela certeza de que as mensagens tinham eco entre o público leitor; e não só, que havia representatividade nos anseios dos leitores em “encontrarem-se, identificarem-se e interagir” naquelas narrativas. Eram afinal, e finalmente, as suas próprias estórias. E, aqui, residia a rotura de que falas, a quebra de convenções, a percepção de que a Literatura era um domínio do Ocidente, e privilégio para consumo de castas “cultas e civilizadas”.  A minha era a recusa e combate ao estereótipo ocidental de que tudo o que é “africano é folclore”.

Como já o afirmei, os meus primeiros escritos foram contos. Assim o fiz, porque por algumas razões: a primeira sendo porque a experiência me ensinava que o conto é o gênero primordial e muito eficaz na veiculação de uma mensagem, de uma estória. Nós, africanos, somos contistas natos, por excelência. Isso está timbrado na nossa matriz genética. Comunicamos uns com os outros, através de estórias curtas, argumentamos através de exemplos quotidianos, de adágios, transmitimos conhecimentos através dos nkaringanas. Essa é a nossa forma de estar, de ser e de comunicar. 

      A segunda razão pela opção do conto era meramente pessoal: não tinha experiência de escrita que me colocasse à-vontade para a elaboração de textos longos. Tinha “medo” de escrever. Embora tivesse aquele arcabouço de leituras, não me sentia em terreno seguro escrevendo novelas ou romances. Preferi textos curtos, com mensagens condensadas. Um leitor ou analista atento pode verificar que nos meus primeiros contos não há diálogos, mas apenas descrições. Sentia-me retraído a colocar os protagonistas a dialogar, tecnicamente falando, encontrava-me manietado pelo medo de errar. Felizmente, com o tempo e com a aprendizagem fui vencendo aquele impedimento até chegar à novela e ao romance.   

   As temáticas sobre as periferias, assim designadas para inferir rural e subúrbios, são dominantes na minha escrita  por razões que têm a ver com a afirmação identitária de grupos sociais marginalizados. Ninguém fala do camponês ou do suburbano como indivíduo com carácter e dignidade. Procuro identificar os valores desse indivíduo e colocá-lo na tribuna de um cidadão,  que possui uma história, que detém valores das suas tradições e tem uma cultura que não é inferior a nenhuma outra. Vou-lhe dar um exemplo: em todas as sociedade existem narrações de violência doméstica e pública. Em Lourenço Marques as havia. Os autores desses eventos eram (os de violência pública, em particular) eram os chamados mabandido. Esses eram jovens que provinham do campo, (majoritariamente de Gaza e Inhambane)  e trabalhavam como empregados domésticos dos colonos, vítimas diárias de abusos físicos e verbais dos patrões. Outros eram operários de construção civil, trabalhadores das fábricas  ou casas de pasto, também vítimas de semelhantes abusos. Todos eram catalogados de incivilizados, criminosos à margem da Lei e das normas de civismo. Não me recordo de ter lido, vez alguma, algum relatório de investigação que tenha revelado a razão profunda, para a disseminação de episódios de violência protagonizados por aqueles indivíduos, em público, e nas suas residências. Havia um problema de desajustamento social, conflitos de culturas, para os quais não havia autoridade ou psicólogo atento em decifrar aqueles desnivelamentos socioculturais. Acreditava que existia (e sempre existirá) um território onde residem valores culturais no indivíduo, que as sociedades ignoram e repudiam como obsoletas e obscurantistas. São esses valores que em muitos dos meus contos procuro trazer à tona. É talvez, por essa razão, que alguns analistas consideram a minha obra em geral, como voltada para o tradicional. Não o nego, porque é aí onde reside a essência dos meus escritos: chamar a atenção para o respeito pelos valores que cada um de nós detém, independentemente da sua origem social, da sua cultura e das suas tradições. Os procedimentos daqueles ditos “criminosos”, mais não eram do que uma sublimação à carga de violência que lhes era infligida pelos seus patrões, pertencentes a uma “civilização superior e diferenciada”. Neste considerando, aconselho a leitura atenta do conto “Operação Djodjo”, do livro O galo ruivo (2022).

     Creio que para um melhor entendimento de uma estória, o estilo e a linguagem devem ser as mais adequadas e apropriadas à mensagem que se pretende veicular. O próprio cenário é fundamental para colocar o leitor no ambiente certo, pretendendo apresentar a estória no universo onde os eventos decorrem. Claro que, ao longo desta experiência, ocorreu uma evolução no uso da linguagem. Aprendi e aperfeiçoei determinadas técnicas da narração que me permitem usá-las como instrumentos para maior eficácia na passagem das mensagens. A escrita é um acto dinâmico: quanto mais se escreve, mais se aprende, e menos erros se cometem. O meu lema é: para cada estória o seu estilo e a  sua linguagem. Isto é fundamental, porque evita-se o ridículo do uso de uma fraselogia longa, desnecessária e desconexa para descrever um acto simples, e tornar complexo o entendimento de um evento. Gostaria de dar um exemplo: se hoje escrevesse o livro “Xitala Mati” fá-lo-ia com aquela simplicidade e aquele encanto que o livro desperta? Se tivesse escrito o romance  Contravenção (de 2008), em 1987, teria conseguido conferir-lhe aquela acutilância que hoje tem? Penso que o momento histórico e a experiência ajudam a definir as técnicas de elaboração do texto, o estilo e a linguagem em simultâneo, sem esquecer o momento espiritual e emocional do autor. Ainda iremos falar sobre isto um dia.

   A minha escrita não de limita a narrações de estórias sobre os meios rurais e suburbanos. Não há dúvidas de que aquelas são dominantes, mas não exclusivas. Temos o exemplo do romance “Contravenção”. Considero-me um escritor multifacetado, mas com timbre marcado pela tradição, pelo suburbano e pelo rural. Tenho crónicas publicadas em revistas nacionais e internacionais sobre temas que nada têm a ver com publicações semelhantes a contos ou novelas. E seria contraproducente fechar-me numa redoma, feito curandeiro de cubata a velar espíritos de antepassados e, nesse exílio, deixar a vida fluir no universo do mundo em que vivo. Não! Estou atento ao que me rodeia, ao que me preocupa e, sobretudo, qual o contributo moral e social que posso prestar à sociedade em que vivo, que mensagem posso transmitir sobre os valores de que cada um de nós é portador, e como usá-los para um melhor e mútuo entendimento e tolerância cultural. Sou um idealista por natureza e por formação.

2.Maiane Tigre – Do risível à profusão de temas utilizados, quais as distintas faces do escritor Aldino Muianga, isto é, o Aldino continua o mesmo da década de 80, com o seu livro de estreia Xitala-mati, de 1987, ou há uma substancial diferença entre a escrita do charrueiro Khambira Khambiray e o prosador inserido no cerne da literatura contemporânea?

Aldino MuiangaTem de haver diferença. Neste caso, uma grande diferença. Afirmei antes que o processo de escrita sofre gradações, existe uma evolução nos processos de redacção dos textos, na selecção dos temas e seu tratamento. Aqui, volto a dizer, os momentos emocionais também variam e determinam a qualidade do produto final, que é a narrativa (conto, novela ou o que for). De 1987 até hoje, beneficiei-me de uma transformação na visão do mundo e do universo em geral. As sociedades evoluíram em vários sentidos. E eu, como membro de uma sociedade, tive de me ajustar àquelas transformações e conceber uma nova visão do mundo. E é nesse mundo onde me inspiro e fotografo as minhas narrativas, com uma linguagem renovada, actualizada, e ao entendimento do leitor que me leia. Considero-me parte de uma sociedade que se transforma. É esse o meu posicionamento, o de não ficar por detrás da História.

     O charrueiro Khambira Khambiray foi o cartão de apresentação de um autor que pretendia estabelecer uma rotura dos preconceitos no modo de fazer Literatura, pela temática e pelo tratamento da linguagem, com tonalidades e impregnações do conto tradicional. Aquele “morreu”, e seu lugar nasceu o Aldino Muianga do “Xitala Mati”, autêntico, detentor de uma vontade de dar a conhecer ao mundo a verdadeira face da nossa identidade, como moçambicanos e africanos. Esse tem sido o estandarte na minha jornada, como um Escritor comprometido com o seu povo, com a valorização das suas tradições, da sua cultura, da sua identidade, no que isso significa, em termos de respeito e reconhecimento daquilo que sou na totalidade, no meu lugar de nascimento, na lingua que falo, nas minhas crenças, nos modos de inserção na sociedade e no modo como concebo o mundo e o universo.

  Repare que o que escrevo, de modo algum, pode ser considerado uma frente de confrontação contra quem quer que seja, ou contra os ditames doutras culturas. Longe de mim tal ideia. O que proponho nos meus escritos é apenas, e isso somente, respeito e reconhecimento das culturas populares, sejam elas rurais, suburbanas ou urbanas, meios que nos conduzam a uma harmonização e equilíbrio nas sociedades em que todos somos chamados a compartilhar experiências, sem pejos, nem descriminações.  Isso somente.    

     Nós, moçambicanos, somos uma sociedade multicutural, com uma riqueza e um colorido étnico e racial singular. Se, no meu caso, optei pela via de exploração do veio rural e suburbano, existem outros escritores que terão optado por outras vias, que é salutar. Todos contribuímos, cada qual dando o melhor de si, para fazer deste nosso país culturalmente multifacetado, um lugar onde cada um dos seus cidadãos se sinta parte e parcela de uma Nação da qual se orgulhe.    

3.Maiane Tigre –  Qual a relevância da cultura moçambicana no conjunto da sua obra? O conto é a pedra de toque de sua prolífica atuação literária. De acordo com Can (2015, p.11),“faz do gênero […] um lugar de permanente reinvenção.”  Como se dá essa reinvenção e de que modo consegue evitar a repetição ao longo dos anos, já que é dono de uma vasta produção, em torno de 19 livros, entre romances e coletâneas de contos, dentre os quais se destacam: O domador de burros e outros contos, (2015), A noiva de Kebera, contos (2016), Asas quebradas, romance (2019)?

Aldino Muianga – De acordo com muitos analistas literários, a minha obra tem sido uma referência em pesquisas sobre vários aspectos, nomeadamente, a simbiose entre o conto tradicional e o conto clássico. Naquele contexto, o conto é a forma mais eficaz de expressão popular, em uso nas comunidades, desde os tempos seculares. Como poderia eu inverter esse processo, senão seguir as suas dinâmicas e modernizar os meios de narrar? Para o povo, o conto é um estandarte na comunicação social. De passagem, posso dizer que em muitas aldeias do campo remoto existem competições de contos tradicionais. Assim se perpetua uma tradição secular baseada na formação de peritos no que tange à transmissão e perpetuação da História dessas comunidades.  O conto, sim, é uma pedra angular, o fulcro onde se articula a oralidade. Foi desta que as comunidades conheceram eventos do passado, dos conflitos entre etnias, de todos os eventos seculares arquivados na memória dos povos. Sem os benefícios dos registos grafados em arquivos históricos, aquelas memórias ter-se-iam perdido e esquecido nos túmulos, onde jazem os seus protagonistas e suas  testemunhas.    A criatividade é essencial em qualquer área de produção artística. A repetitividade instala-se onde não existe criatividade. Penso que existem sempre formas de criar novas situações, novos enredos, invenção de novos protagonistas, com diversas intervenções no texto. Isso é o que cria esse dinamismo no processo de escrita do autor. Este não pode ser estanque, à espera que os acontecimentos lhe cheguem à mão. A busca, a pesquisa de novas estórias é primordial na obra de qualquer criador artístico. Um Escritor é um artista por excelência. Nessa qualidade, ele capta sensibilidades e memórias; reinventa e reproduz, sonha e concretiza. Esse é o processo de reinvenção que em mim decorre ao longo da minha produção literária.  Gosto de dizer que um Escritor tem seis sentidos, sendo, o sexto, o da reinvenção do real.

4.Maiane Tigre – O mítico, a espiritualidade, o sobrenatural, a dimensão telúrica, a presença de espíritos convivendo com os vivos, são alguns dos ingredientes fundamentais na composição de suas narrativas. Portanto, qual seria a hermenêutica ou linha de leitura mais conveniente para interpretar as histórias dessas gentes, melhor dizendo, qual seria a sintaxe do sonho utilizada na arquitetura dos seus textos?

 Aldino Muianga – Nas culturas africanas, e a moçambicana não foge como excepção, a relação entre vivos e defuntos é intrínseca, presente e concreta. Existe, entre nós, a concepção de que os defuntos estão presentes na vida de cada um e determinam de modo subtil o deselance de eventos do quotidiano. São exemplos correntes nas famílias, e em indivíduos, em particular, a atribuição de fatalidades, de doenças prolongadas, de desemprego, de infertilidade e outros malefícios como sinais de intervenção de defuntos.

     A relação à que me refiro, manifesta-se pelo empenho dos vivos, em práticas de rituais de apaziguamento dos defuntos, aos quais os vivos se submetem e imploram pelo sua intervenção, para uma vida isenta de perturbações. O uso de amuletos, os rituais de invocação nos túmulos, os exorcismos nas cabanas dos magos, as práticas de autoprotecção contra o mau-olhado, são algumas das inúmeras práticas que o africano, de um modo geral, recorre para estabelecer aquela ponte entre si e os seus defuntos.

   Na minha prática clínica, testemunhei casos desta relação entre os meus pacientes, com os seus defuntos. Cito apenas alguns exemplos, que ilustram aquele compromisso entre vivos e mortos. Para mais detalhes, remeto o leitor ao livro “Hospital, contar clinicando, Volume I” a ser publicado em breve.

5.Maiane Tigre – Você acredita que poderia ser considerado um escritor da tradição, cuja escrita se circunscreve a um momento histórico específico do pós-independência, diretamente vinculada à Geração Charrua, um escritor da ruptura, que subverte o próprio estilo, ou se classificaria, justamente, como a intersecção desses dois momentos, tornando-se um prosador atemporal, que está além de fechamentos ou reducionismos estanques?

Aldino Muianga – Na minha obra está vincado o compromisso de seguimento de uma linha que se pauta pela narração de eventos ligados às culturas e tradições  nas comunidades do meu país. As tradições, as culturas, os mitos e todos os valores de espiritualidade sempre existiram, e são perenes. O que narro só pode deixar de ser novidade para quem anda desatento às dinâmicas das sociedades periurbanas e rurais. A literatura que ficção fundamenta-se nisso, no revolver da História das comunidades, independentemente do tempo onde ela (a História ou as estórias) possa ter lugar. Repare que no livro “A Noiva de Kebera” se descrevem eventos do período pré-colonial, como prova da atemporalidade da minha escrita. Não me cinjo a espaços estanques, como já o afirmei anteriormente. O que informa os meus escritos são fundamentalmente as culturas, as suas intercepções, os conflitos que esses cruzamentos geram, as soluções achadas para a conciliação destes universos aparentemente contraditórios. A rotura apresenta-se como a abertura de uma página inédita na linha temática, que privilegia o subúrbio e o campo como cenários onde desfilam protagonistas doutras culturas, que não as convencionais e catalogadas como  “superiores”.

6.Maiane Tigre – A figura da prostituta possui significativa centralidade no âmbito da produção literária moçambicana. Em Meledina ou a história de uma prostituta (2010), observa-se um retorno ao tempo colonial, na condição de romance histórico. Qual o enquadramento dessa obra, do ponto de vista da História de Moçambique? Este romance possui elementos que sedimentam a tradição literária do país, face ao papel transgressor desempenhado pelas prostitutas representadas na pena dos escritores da nova geração, como Rabhia, de Lucílio Manjate, e Shonga, de Pedro Pereira Lopes, personagens modelares da subversão?

Aldino Muianga – No livro em referência, a figura da protagonista Meledina simboliza o nível de degradação da Mulher, ela é a porta-estandarte de um exército de oprimidos pelo colonialismo na frente da exploração sexual. Naquele espaço e tempo colonial, a prostituição dir-se-ia institucionalizada, sindicalizada, um “bem de consumo oficial”, para as elites coloniais. “Meledina “ constitui-se como um valor que se assume como um simbolismo de dignidade como Mulher, mãe, e porque não? Esposa virtual do seu próprio opressor. A prostituição é um mal das sociedades, com desigualdades socioeconômicas, e Moçambique não foge a esse desiderato. Vivemos numa sociedade viciada onde impera a lei-do-mais-forte, na qual a Mulher assume um papel de serva, de sub-cidadã, de um instrumento avassalado por uma sociedade patriarcal.  É nesta corrente que alguns escritores do meu país focam algumas das suas produções sobre aquele problema e o seu impacto na sociedade. São sinais de protesto (e este é um dos papéis da Literatura) que, espero, tenham algum eco nos ouvidos de quem tem a responsabilidade de consertar os desconcertos deste País. 

7. Maiane Pires – Comente sobre a recente publicação do livro O galo Ruivo (2022), destacando as principais inovações, além de mencionar o mote primordial dessa narrativa. Quais são os projetos futuros voltados para sua carreira literária?

Aldino Muianga – “O galo ruivo” é uma colectânea de contos, que retrata o perfil sociocultural e económico dos habitantes do cosmos suburbano da cidade de Lourenço Marques e dos meios rurais. Naquela compilação, as narrativas denotam  uma nova dinâmica  na estruturação  dos textos, que se podem considerar como uma exploração doutros veios de ficção narrativa. Em alguns contos, o uso de metáforas e de trocadilhos confere um pendor poético original na linha de escrita a que habituei o leitor. Às vezes me pergunto se a poesia não estaria a ressuscitar dentro de mim… Continuo a escrever, tanto quanto possível, sempre à busca de novos elementos, com que enriqueça os meus escritos. Para o ano corrente, projecto publicar um romance, uma novela e uma colectânea de contos. Os livros já foram entregues ao Editor, para as protocolares valiações e processamento das burocracias pré-publicação.

Grato pela atenção.

Aldino Muianga

Pretória, 20 de Janeiro de 2023


[1] Doutoranda em Letras: Linguagens e Representações (UESC). Bolsista FAPESP. Membro do Grupo de Pesquisa GpAFRO: Literatura, História e Encruzilhadas epistemológicas. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2240-325X. E-mail: maiane.tigre@hotmail.com. Esta entrevista é o resultado parcial da minha tese de doutoramento orientada pela profa Dra. Inara de Oliveira Rodrigues (UESC) e co-orientada pela profa Dra Sara Jona Laisse (Universidade Católica de Moçambique – extensão de Maputo).

Fonte da imagem: Plataforma Mbenga

Lançamentos!, Outras maravilhas humanas

Litafrika – exposição na Suíça (Zurich) celebra “encontros artísticos” africanos

Será acolhida em Zurich (Suíça), entre 16 de Junho e 3 de Setembro de 2023, uma exposição com artistas africanos.

A curadora da exposição, Zukiswa Wanner, monta uma encenação de encontros entre romances contemporâneos, performances, música ou arte visual. Atravessando fronteiras nacionais e barreiras linguísticas, a exposição lança luz sobre uma geração de escritores interligados e activos internacionalmente.

Zukiswa Wanner responde à primeira parte da série de exposições “litafrika” (2022-2024) com oito textos em prosa. Como uma forma de continuação do “Poesias de um Continente” (2022), coloca ênfase no romance, em vez de no poema, especificidades em vez de abundância – e sobretudo nas diversas histórias de autores mais jovens, em vez dos autores clássicos pós-coloniais: com que temas as figuras literárias contemporâneas lidam hoje em dia? Como é que os artistas encenam as passagens seleccionadas?

“A exposição compreende alguns dos mais talentosos autores contemporâneos, músicos, actores e artistas visuais da minha geração de países de África em língua inglesa, francesa e portuguesa. Os países representados nesta exposição fazem apenas 25% das nações da minha África, mas como pan-africanista, escolho ignorar as fronteiras e prefiro concentrar-me na forma como as nossas histórias, sons, expressões e arte que verão aqui ressoam em todo o segundo maior continente do mundo”. Zukiswa Wanner.

Para os “Encontros Artísticos”, foram criadas parcerias que transferem literatura para vídeos e obras de arte e ao mesmo tempo aprofundam o diálogo entre regiões linguísticas através da tradução de textos. A exposição está concebida para ser exibida também no continente africano.

“De alguns, já terão ouvido falar”. De outros, espero que fiquem entusiasmados em conhecer nesta exposição”.

Ishmael Beah (Serra Leoa): Radiance of Tomorrow (2014)                 

x Shaffik Manzi (Ruanda): artista visual   

Virgília Ferrão (b. 1986, Moçambique): Os Nossos Feitiços (2022)

x Jussara Camble (São Tomé e Príncipe): actriz

Abubakar Adam Ibrahim (Nigéria): Season of Crimson Blossom (2015)

x Zikhona Sodlaka (África do Sul): actriz

Angela Makholwa (África do Sul): Critical but stable (2021)       

x Michael Soi (Quénia): artista visual

Jennifer Nansubuga Makumbi (Uganda): The First Woman (2020)

x Ntombephi Ntobela (África do Sul): artista visual

Yara Nakahanda Monteiro (Angola): Essa Dama Bate Bue (2018)

x Zubz the Last Letter (Zâmbia): músico

Fiston Mwanza Mujila (República Democrática do Congo): Tram 83 (2014)

x Prudence Katomeni (Zimbabué): músico

Ondjaki (Angola): Os Transparentes (2012)      

x Seeretse (Botsuana): músico

Sobre a Curadora:

Zukiswa Wanner (b. 1976, Zâmbia) é escritora e mediadora de literatura ; vive na África do Sul e no Quénia. Wanner publicou contos, romances e livros infantis e esteve na lista “Africa39” em 2014; em 2020, recebeu a Medalha Goethe pelos seus serviços de intercâmbio cultural internacional.

Fonte do texto:

Lançamentos!

SORTEIO DE LIVROS – EXLCUSIVO PARA O CLUBE QAWWI

Por ocasião da época especial que é o Natal, o Diário de Uma Qawwi pretende partilhar com os leitores membros do Clube Qawwi, a magia dos livros!

Desta forma, o Diário de Uma Qawwi irá sortear no dia 18 de Dezembro de 2022, os seguintes livros e brindes:


1. Os Nossos Feitiços, de Virgília Ferrão

Este livro foi lançado em Junho de 2022, no Brasil, pela Katuka Edições. O livro ainda não está disponível nas livrarias de Moçambique. O leitor que ganhar esta obra irá receber também uma versão em áudio (USB) do mesmo.

2. Sulwe, de Lupita Nyong’o

A editora 3009 acaba de trazer ao público o livro infantil Sulwe, da autoria da actriz Lupita Nyong’o. A obra foi traduzida para português pela tradutora e editora Sandra Tamele.

3. Coletâneas de contos (vários autores), editora 3009

Ganhe dois volumes da colectânea de melhor iniciativa de tradução literária do mundo em 2021.

4. A Refugiada, de Teresa Taímo

Teresa Taímo é uma das autoras da antologia Espíritos Quânticos, e publicou recentemente o livro “A Refugiada”.  O livro anda raro pelas livrarias, pelo que, aproveite neste sorteio!

5. Objecto Oblíquo, de David Bene e Mélio Tinga

Mélio Tinga também é um dos autores da antologia Espíritos Quânticos. Objecto Oblíquo, escrito em co-autoria com David Bene, é um lindo livro de poesia, que está quase esgotado no mercado, aproveite!

6. O Inspector de Xindzimila, de Virgília Ferrão

Este livro foi lançado em 2016 e encontra-se esgotado em Moçambique. É uma boa oportunidade para os leitores que não tiveram a oportunidade de o ler no passado. Ganhe ainda um bonito mousepad personalizado com a capa deste livro.

O sorteio vai acontecer no dia 18 de Dezembro e será extensivo a todos os membros do Clube Qawwi (inscritos no whatsapp ou no email).

Para ser membro do Clube, basta aderir ao grupo do WhatsApp, ou deixar registado o seu email em “quero ser membro exclusivo” nos links abaixo:

Partilhem com amigos e familiares que apreciam a literatura e possam ter interesse numa destas obras!

Lançamentos!

Pedro Baltazar volta a celebrar os rios com “55 Rios”

Em seu novo livro de poemas, o segundo, Pedro Baltazar, autor de “O parto dos rios”
(2021), exerce, essencialmente, a função de sujeito poético intimista, lírico, embora não
faltem, como no seu livro de estreia, poemas de intervenção social, de queixa e de
denúncia (“O ladrão do Xiquelene recebeu o seu diploma na Academia de Ciências
Policiais/ O chefe do quarteirão engravidou a viúva do Langa”). O livro “55 Rios” é uma colectânea organizada em três fozes, nomeadamente “Maputo”, “Zambeze” e “Rovuma”, mesmo a lembrar as três zonas do país, sul, centro e norte; e a unidade nacional, a paz. De acordo com a estudiosa Irene Mendes, que escreveu o prefácio, “a Primeira Foz pertence ao sujeito poético; a Segunda Foz é dedicada aos outros: esposa, a quem ele chama de vizinha, mãe, pai, filhos, amigos; a Terceira Foz é integrada por poemas interventivos e críticos, de que se pode destacar “Os ratos roeram tudo” ou “Um cão chamado Botha”.
Para Irene Mendes, “55 Rios”, de Pedro Baltazar, “é uma obra que mostra a sensibilidade do poeta, sobretudo ao reconhecer a importância das pessoas com quem convive no seu dia-a-dia, mas também por dar a conhecer uma parte de si, através da sua autobiografia”.
Pedro Baltazar, que também é advogado, empresário e professor, assume que a inspiração para o livro foram as geografias da Baía de Maputo, com os morcegos andorinhas da Costa do Sol.

“55 Rios”, que integra a colecção “Biblioteca de Poesia Rui de Noronha”, da Gala-Gala
Edições, será apresentado pelo Professor Catedrático Armando Jorge Lopes, no dia 9 de
Novembro, pelas 18 horas, no Instituto Guimarães Rosa/ Centro Cultural Brasil-
Moçambique.


Sobre o autor:
Pedro Baltazar é um dos pioneiros da actividade de segurança privada em Moçambique.
Militar na reserva, é formado em Engenharia de Comunicações e Telecomunicações
Militares, Ciências Jurídicas, Gestão de Empresas e possui um doutorado em Direito
Privado, pelo convénio entre o ISCTEM e a Universidade Nova de Lisboa. É gestor,
advogado e docente universitário. Publicou os livros “Influencia da OIT no Direito de
Trabalho Moçambicano” e “Actividade de Segurança Privada em Moçambique”. Escreve poemas há mais de uma década. Publicou, em 2022, o livro de poemas “O parto dos
Rios”.

Outras maravilhas humanas

Vencedor do Prémio Chakwera é o Moçambicano Ortega Teixeira

Foi anunciado numa cerimónia que decorreu no Malawi no dia 4 de Novembro do corrente ano, o vencedor do Prémio Chakwera para Discurso Público. O Prémio Chakwera para Discurso Público é um concurso anual e na sua primeira edição, convidava cidadãos dos 16 Estados Membros da SADC a apresentarem áudios gravados, articulando as suas ideias inovadoras para reforçar a unidade Pan-Africana.

Segundo a nota partilhada pela Casa do Estado do Malawi, Sua Excelência o Dr. Lazarus McCarthy Chackwera, Presidente da República do Malawi, entregou na tarde do dia 4 de Novembro, o prémio inaugural, ao seu primeiro vencedor,  o moçambicano João Ortega Teixeira Amone.

O Presidente instituiu este prémio, que vem acompanhado de um valor monetário de 4.000 USD, em 2021, durante o seu mandato como presidente da SADC, para incentivar a visão dos jovens africanos, sobre as suas aspirações para o Continente. O valor monetário do prémio para este ano foi patrocinado pelo Banco NBS e a Simso Malawi, cujos líderes estiveram presentes na cerimónia para testemunhar a entrega do prémio. Também esteve presente o embaixador adjunto de Moçambique,  o Sr. José Zita.

O discurso de Ortega Teixeira, vencedor do prémio, que foi submetido em Português, abordou a necessidade dos africanos trabalharem e manterem-se unidos como um só no palco do mundo, por forma a protegerem os recursos africanos, contra exploração e abusos. O Presidente congratulou Ortega Teixeira pela coragem clara e paixão na sua entrega e incentivou todos os cidadãos africanos a continuarem a usar a sua voz para partilharem a verdade para empoderar, porque a palavra é poder.

O Diário de Uma Qawwi participou no concurso como um dos membros do Júri, e toma esta oportunidade para parabenizar o vencedor do prémio, bem como a Presidência da República do Malawi por esta iniciativa.

Sobre João Ortega Teixeira Amone: nasceu a 02/03/1982, distrito de Nhamatanda, província de Sofala, mas vive em Chimoio desde bebê. Foi professor primário e secundário no pós-laboral, de 2001 a 2010, nos distritos de Machaze e Chimoio, leccionando História e Língua portuguesa. É Jornalista, trabalha na RM desde Maio 2010. Licenciado em Jornalismo pela Escola Superior de Jornalismo. Começou a escrever crónicas em 2006 na Rádio Comunitária Gesom, arte que o levou à RM. Desde Maio de 2020 é Assessor de Imprensa da Governadora de Manica. Foi vencedor da V edição do Grande prémio nacional  SNJ/Vodacom na categoria “Areosa Pena” para a melhor crónica em 2012. Foi vencedor do prémio qualidade na RM para a melhor crónica em 2014. A RM centralmente indicou a quarta-feira para a transmissão das crónicas que o autor apelidou “coisas da nossa terra” por resultarem do trabalho de campo, em busca de algo inédito nas comunidades.

Imagens: cortesia da State House Malawi

Outras maravilhas humanas

Submissões e publicações

Caro(a)s Leitore(a)s, Caro(a)s Escritore(a)s,

Temos a honra de anunciar o novo formato do Diário de Uma Qawwi (DDQ).

Para além de contarmos com novos parceiros, finalmente abrimos as portas para a recepção e publicação de textos. A nossa janela de submissões corre de 1 de Novembro a 28 de Fevereiro.

Durante esta janela iremos também seleccionar textos para o Volume 2 da antologia Espíritos Quânticos.

Estamos todos ansiosos para receber dos nossos autores e autoras, e para partilhar com os nossos leitores e leitoras, o melhor da literatura fantástica!

Confira os detalhes AQUI

Diário de Uma Qawwi

31 de Outubro de 2022