Outras maravilhas humanas, Resenhas

|Maravilhas humana| Txopela de Stewart Sukuma

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Imagem: SapoNoticias

No imaginário infantil, no trópico de Capricórnio, txopelar nunca foi, tão só, uma aventureira e arriscada viagem de alguns segundos ou minutos. Muito pelo contrário, é a realização de sonhos que exorcizam vontades recalcadas. Noutros tempos, as crianças se penduravam nos taipais dos Land Rover, dos Bedfords e Ifas, até nas bicicletas se boleiam aproveitando a distração do pedalante, para provarem ao mundo a sua agilidade e destreza.

A modernidade transformou os veículos, mas nunca o sentido da aventura. Hoje, txopelamos em chapas de outras latitudes. Carroçarias empilhadas e a determinação de uma vontade que perdeu a ingenuidade. As emoções e os prazeres, não se algemaram no tempo e, testemunham a sua longevidade. A verdade foi sempre a filha do tempo e a sabedoria a filha da experiência. Txopelar combina o espelho da alma para dar sentido as vivências e experiências de Stewart Sukuma.

A janela da alma habita no intelecto e, lá se encontram os sentidos. Todos ou alguns. Mas, só o cérebro percebe o que é transmitido pelos sentidos. As imagens, ainda assim, viajam no sentido inverso. Muito antes de qualquer transmissão, revelam a plenitude da natureza e a graciosidade de uma mulher miscigenada. Estas as imagens que combinam à memória, à sensualidade e a luta de um povo, de várias gerações, o clamor pela vida e pela luz, a força de todos estes tempos e outros que ainda estão para chegar.

Assim, como uma canção harmoniosamente bem tocada proporciona um prazer efêmero, uma imagem expressiva, abre as portas para um mundo de sonhos. A ideia pareceu simples. O tempo amadureceu e o txopela se reconfigurou. Ganhou sua identidade e transportou milhões de seguidores. Txopela deu boleia a lusofonia e entrou pelas nossas casas desregradamente. Ninguém desgostou. Pelas telas se transformou numa colmeia de abelhas que se deliciaram de um mel que soube a pouco. Agora regressa à conta-gotas.

Ainda juvenis aprendemos que as imagens são irmãs dos sons agradáveis. Esta aula deve ter interessado sobremaneira ao Stewart Sukuma. Ainda tacteava o seu mundo, o seu espaço. A adolescência empurrou para o sentido da audição. Privilegiou o que mais mexe com os corpos e menos com a mente.

Sukuma foi o promotor do txopela. Internacionalizou uma das expressões mais acarinhadas do país. Txopelando a tecnologia e a beleza genuína da paisagem e suas histórias, articulou como ninguém, o que de melhor este país teria para oferecer.

A música e as imagens, em movimentos ou fixas, são feitas para dar vida e harmonia ao tempo. O bom músico tem dois propósitos. Fazer da vida dos que escutam um tempo mais agradável e, pintar no nosso imaginário o txopela das emoções. O verdadeiro sentido da harmonia reside nesta combinação e seleção do que de melhor o nosso país pode oferecer.

Txopela palmilhou o país de lés-a-lês. Porém, perdeu-se de amores na Ilha dos poetas. Aqui neste espaço-tempo território onde as pétalas tem sabor a maresia, os espíritos desgrudam-se de árvores centenárias, escritores vendem suas almas e, os temperos, enfeitiçam visitantes desavisados. Muhipiti, também, vive txopelada nas ondas de uma onda que aquece o Índico.

Somos todos insulares e nos refugiamos no continente, procurando uma clave de sol que ficou tatuada na memória das paredes das imagens espalhadas pelos nossos corações. Vivemos txopelados pela modernidade de cores e luzes, de um vento que soprara para todo o sempre. Estas imagens são uma cumplicidade de sentimentos, de panorama da qualidade do mais moderno écrans televisivo, misturando em única imagem, o passado, presente e o futuro de forma exuberante.( X)

Jorge Ferrão

Outras maravilhas humanas, Resenhas

Maravilhas humanas | A Vingança do Mítico Pangolim

Por Jorge Ferrão

Os nexos que se estabelecem entre os animais selvagens, em vias de extinção, e os esforços para sensibilizar sobre a importância de sua conservação, têm conduzido os organismos internacionais e as principais agências responsáveis pela gestão da fauna, a estabelecerem datas especiais para celebrar os pequenos sucessos na preservação destes animais. Todavia, parece cada vez mais evidente a existência de uma preocupação em relacionar o consumo de diferentes espécies de animais, nomeadamente, cobras, morcegos, ratos, escorpiões, lagartos e pangolins, com as várias epidemias e pandemias, que criam um desassossego às economias e às sociedades, um pouco por todo mundo.

O pangolim (Manis Temminckii) tem, também, agora um dia especial, 15 de Fevereiro. Deste modo, Moçambique e o mundo celebram os poucos pangolins, ainda vivos, e os milhares que foram sacrificados e que deixaram de dar o seu contributo aos diferentes ecossistemas e às economias agrícolas familiares.

Desde o começo desta semana, especialistas, estudantes, amantes da fauna, curiosos e, até, leigos, tem a oportunidade de visitar um dos mais míticos e cobiçados animais da nossa fauna, por vezes tão descuidada e perseguida, outras vezes, tão relegada ao abandono e ao seu próprio destino. Estamos em festa e celebramos o pangolim.

Pangolim, a espécie mais ameaçada do mundo

Em 1999, a legislação moçambicana estabeleceu o pangolim (Manis Temminckii) como uma das espécies protegidas, e cujo consumo e venda foi vedado. Entretanto, esta proibição apenas foi decretada pelo CITES (Convenção sobre o Comercio Internacional das espécies em perigo de Extinção) em 2017. O pangolim tem sido uma das espécies que, à semelhança dos elefantes e dos rinocerontes, tem sido, invariavelmente, traficado e já colocado como uma espécie em vias de extinção no país. O pangolim caminha, assim, para um precipício iminente e sem retorno.

O comércio ilegal do pangolim aumentou consideravelmente desde 2008 em África e, um pouco por todos os relatórios mundiais de preservação da fauna, os dados confirmam o tráfico de, pelo menos, um milhão (1.000.000) de pangolins para China e Vietnam, os países que mais consomem e influenciam o contrabando dessa espécie na ultima década, porém, este numero foi já ultrapassado apenas num único ano, isto é, em 2019 com cerca de mais de 1.200.000. Aliás, as mesmas redes de contrabando que operam no tráfico de marfim, cornos de rinoceronte e madeira, são as que, aproveitando-se de esquemas de suborno e corrupção, traficam pangolim vivo, congelado ou as suas escamas as toneladas.

Estas redes melhoraram, inclusivamente, o seu modus operandi, através do uso de redes sociais como o Facebook, para anunciar a venda de seus produtos e estabelecer cadeias de preço.

O tráfico se justifica e intensifica pelo facto de as escamas serem utilizadas para o “tratamento” e prevenção de várias doenças e patologias, nomeadamente, a disfunção sexual, as doenças cardíacas, câncer e até as deficiências de lactação da mulher. Os médicos mesmo na China rejeitam estas propriedades mas as farmácias continuam a vender aos seus clientes. Não obstante, as crenças continuam mais fortes do que as evidências científicas e o número de usuários não pára de crescer.

Se, por um lado, temos estas pouco provadas e testadas evidências de propriedades medicinais, que geram alta demanda, por outro lado, continua preocupante o consumo da carne do pangolim, muito apreciada na restauração, nos principais restaurantes de luxo na Ásia. Em determinados restaurantes, o prato de pangolim, pode chegar a um custo aproximado de 500 dólares norte americanos ou equivalente. Aliás, nestes locais, o animal é vendido ainda vivo, e é degolado na presença do cliente para que este possa também comer ou beber o sangue.

Entre a superstição e a verdade

Ao longo de milhares de anos, foram identificadas oito (8) espécies de pangolim nos continentes asiático e africano. O pangolim é um mamífero escamoso da ordem Pholidota, por sinal a única espécie existente, também, designada Manidae, que possui três géneros.

Na Ásia, o pangolim está quase extinto e em alguns países desapareceu ainda no século passado. Em África, ainda, são encontradas quatro (4) espécies de Manis, nomeadamente, Phataginus, Smutsia, Tricuspis e Temminckii, espalhadas um pouco por todo o continente. A espécie Temminckii, eventualmente a mais representativa, pode ser encontrada na África Austral, Oriental e até na região do Corno de África, para além do Norte de África. As restantes encontram-se na África Central e Ocidental.

Estes mamíferos chegam a pesar entre 1,5 quilos até os 20, 25 quilos ou mesmo 35 quilos. Porém, em média, eles possuem entre 3,5 a 10 quilos, e podem ser encontrados em todo Moçambique, próximo das termiteiras e ou em locais cuja presença de formigas seja abundante.

O pangolim consome cerca de 190 mil formigas, por dia, o equivalente a 70 milhões de formigas, por ano. Lento, e que vive enrolado no interior destas termiteiras, o pangolim é considerado, pelos agricultores, como o mais eficaz controlador de pragas e térmitas que devastam os campos agrícolas do sector familiar.

Com a língua que é mais comprida que o próprio corpo, o pangolim tem um vasto conjunto de benefícios para o ecossistema e reduz, igualmente, os habitantes dos morros de muchém, que são devastadores para os agregados familiares, que sofrem com os efeitos das térmitas até no espaço habitacional, apodrecendo, de forma precoce, os aros das portas, das janelas e até as estruturas das casas.

O pangolim é mítico e gera sentimentos obscurantistas e da mais pura ignorância. No nosso país, ele tem diferentes nomes. No norte do país, o Pangolim é designado Ekha, na região de Tete o nome é Xiphalualo, no centro, Manica e Sofala é conhecido por Xikwari e, no sul, por Halakavuma. O seu surgimento suscita controvérsias e diferentes interpretações. Acima de tudo, ele é o mensageiro e tanto pode anunciar a desgraça, como a bonança. No Norte de Moçambique, a chegada do pangolim representa uma época de chuvas regulares, excelentes colheitas e um ano de muita prosperidade. No Centro, Idem. Porém, no sul, a chegada do pangolim anuncia desgraças, períodos de cheias, secas e várias pandemias. São os curandeiros, regra geral, aqueles que são chamados para interpretar a mensagem e comunicar os conteúdos ao resto da população.

Se, por um lado, o pangolim sofre do obscurantismo e de ignorância, por outro, é vítima de arrogância e de ganância desenfreada. As pessoas tem medo de se aproximar e de segurar as suas escamas, e são educadas a nunca olhar de frente para este animal. Aliás, continua célebre a preocupação de que tocando no animal, os casais terão três filhos.

Mas tem sido a ganância o maior mal de que o mamífero sofre. 2019 foi o pior ano no tráfico do pangolim, em Moçambique e no mundo. Em Hong Kong foram descobertas 8 toneladas de escamas e mais de 1000 pontas de marfim, enquanto na Malásia foram descobertos 3 mil toneladas de pangolim congelado e mais de 400 quilos de escamas. Em Singapura, mais de 24 toneladas de escamas foram descobertas, de forma sucessiva. Todo este volume se destinava à China e ao Vietnam.

As rotas envolviam diferentes intermediários e diferentes países. Em média, 159 rotas diferentes foram usadas pelos traficantes entre 2010 e 2015, com médias anuais de 24 toneladas, ou seja, 1,5 milhão de pangolins abatidos.

A Vingança do pangolim

A vingança do Pangolim poderia ser o nome de um filme de ficção, com um roteiro previamente estruturado e com películas gravadas em diferentes sites e continentes. Porém, não é ficção e nem pura e ingénua imaginação. É uma tragédia anunciada. Estudos mais recentes, ainda em fase de pesquisa, conclusivos ou não, indicam que o consumo do pangolim pode estar associado ao mortífero vírus do corona, que desgraça a China e retira o sono e o sossego de todo mundo.

Caso se confirme que o pangolim é o verdadeiro hospedeiro do coronavírus, uma nova atitude e postura terá que surgir em relação ao pangolim. Importa referir que estes e outros animais selvagens são portadores de diferentes vírus e que novas estirpes podem desenvolver, escapando-se das defesas do organismo humano e apanhando de surpresa o pacato cidadão. Ultrapassa a fasquia dos 1000, o número de vítimas e, já se superou o número de vítimas do vírus das aves (SASR) que teve o seu epicentro na Ásia e que, por sorte, não gerou efeitos mais devastadores no continente africano.

Enquanto isso, celebremos o pangolim e todo o misticismo que ele representa nas nossas vidas e nos nossos espíritos.

Outras maravilhas humanas

Crónicas de uma viagem anunciada

Por Jorge Ferrão

MSC Orchestra 

Vamos iniciar o percurso. Cruzar os oceanos que Vasco da Gama e Luis de Camões só passaram próximo. Não poderíamos imaginar a grandeza do Orchestra. Para dificultar, o nosso camarote fica na viola. Nono andar. Estibordo. Tem todo o tipo de gente. Camisetes e chinelos. Corpos desnudados e indiscretos. Cadeirantes e apressados. Imensidão de sonhos. Desejos e vontades. Presépios e árvores natalinas. O Índico recebe-nos de braços abertos, sem sol. Por enquanto, também, sem marés. Até agora só ondulamos os espíritos. Depois, serão as almas. A esta altura, e condicionados no décimo terceiro andar de um prédio flutuante, parece um mar nunca antes navegado. Este é o lugar onde terminam todos os medos. Não sabemos se contemplamos as pessoas ou as águas. Já sem os passaportes, somos transformados em números. Quem disse que os negreiros eram só para os exilados? Fica a promessa. Seriam 12 dias de águas e ventos. Suspiros e doces desordens. O primeiro de 12 aventuras numa viagem anunciada.

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Depressão tropical Calvinia, na rota do Orquestra (4 dias de oceano Índico)

Esta manhã o Orchestra atravessou o trópico de Capricórnio. Para celebrar, Neptuno foi designado o padroeiro e promotor da festividade. Cercado de bandeiras e crianças, Neptuno sugere que todos se sentem à volta da piscina, para que possam desfrutar dos banhos de champagne, tomate, leite e outros.

Mas, pelo coração destes 2869 cruzeirantes, as preocupações são outras. A depressão tropical Calvinia ganhou força e está em direcção às Ilhas Reunião e às Maurícias. Todos os radares e atenções se centram na Calvinia. O instinto do capitão diz que o ideal será atrasar a chegada por um dia. Viajamos a 70 nós, mais ou menos, 32 km/h. Assim, só teremos de prover auxílio a quem necessita.

Mais logo, será o final de um longo 2019. Renovam-se as esperanças, como sempre, para um 2020 de bonança, prosperidade e felicidade. Queremos a magia do novo ano transformando as nossas vidas mas não fazemos nada para sermos essa mudança. Celebraremos a ladainha de um ano melhor, mas continuaremos iguais, inflexíveis, pouco tolerantes. Champagne ajudará a afogar as mágoas e o Cruzeiro seguirá em frente, algures no meio do oceano dos sonhos.

Esta manhã as sirenes tocaram. Aconteceu o insólito. Um jovem de 19 anos equipou-se de colecte salva-vidas e atirou-se ao mar. Passava das 04:00 da manhã. Todos acordaram e, por pouco não nos cruzamos pelos corredores, tal como viemos ao mundo. Uma massiva operação de resgate fora encetada. Jovem menino são e salvo…. mas ninguém ganhou para o susto. Recuperou junto de seus familiares. Teria que abandonar o navio e regressar via aérea. As multas já estavam definidas. Ia pagar pelos demônios que se apossaram dele e pelos anjos que o salvaram.

Possession- Le Port et Saint Dennis

Os portugueses foram os primeiros europeus que visitaram esta ilha. Não admira. Era inabitada desde 1513, e apelidaram-na Santa Apolónia. Aqui localiza-se a mais alta montanha de todo o oceano Índico. 3069 metros de pura altitude. Mount Piton Des Neiges. Basta levantar a mão para saudar Deus e Jesus Cristo. Vulcânicas, com dois vulcões ainda activos, Aumenta de cada vez que as larvas fazem-se à superfície. Ao longo da história foi pertencendo a diferentes protectorados, entre Holanda, França e Inglaterra, mas, em definitivo, actualmente, pertence à França e tem a bandeira da França e da União Europeia. Um pouco maior que as Maurícias, as famosas ilhas gêmeas têm 980 milhas quadradas com mais de 40 km de praia. Estas montanhas são pura sedução. Agora, voltamos ao mar puro sem mais ameaças de ciclones e com uma saudade creola de morna e coladeira.

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Onshore

Finalmente, terra firme. Como diz o poeta. “… ao longo da muralha que habitamos há palavras de vida, palavras sem vida. Palavras imensas, que esperam por nós e, outras, frágeis, que deixaram de esperar. Há palavras acesas como barcos e há palavras homens, palavras que guardam o seu segredo e a sua posição! Há palavras diamantes, palavras nunca escritas, palavras impossíveis de escrever!

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Outras maravilhas humanas

As monções e os templos do amor

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 Por: Jorge Ferrão

Índia aproveita a suavidade do inverno tropical, para alinhar os seus ideais, metas e objectivos. Estes períodos de transição, grosso modo, se imbuem de espíritos benignos, esperanças renovadas e certezas de um presente, que não pode ser futuro e muito menos passado.

Visitar India, não importam as razões, parece um sonho, longo e inacabado. Todos, sem excepção, queremos, um dia, desfrutar desse misticismo dos templos, contemplar a grandeza Gandhiana, mergulhar na sétima maravilha do mundo, imponente Taj Mahal, arrepiar com o inacreditável Ganges, lacrimejar as papilas gustativas com sabores picantes de caril dos ventos, reverenciar  a diversidade e a espiritualidades das línguas. Todos queremos provar o chá, com ou sem Massala, que não é apenas uma bebida, mas uma cultura milenar.

A Índia está segura que será o país mais populoso do mundo nos anos dois mil e vinte e dois mil e vinte e cinco. Igualmente, fará parte das cinco maiores economias do planeta. Estas perspectivas já remexem as posições políticas estratégicas geo-políticas. As monções se configuram generosas. A natureza tem sido benevolente. A India não procura parceiro, são estes que vasculham os caminhos que vão dar as Índias, como foi a rota milenar das sedas e especiarias.

Um pouco mais de 93 países e 600 convidados desdobram-se em explicações e conjecturas, sugerem modelos e roteiros para assegurar que não ficarão excluídos das rotas e círculos finais. Assegurar que as novas geometrias os incorporem. São sonhadores, políticos, governantes, estudiosos, generais e peritos que se antecipam a aurora do novo gigante.

Os mares foram os responsáveis e a principal via de ligação entre os nossos povos e países. O oceano Índico serviu de berço e estrada de civilizações, segredos, partilhas e amizades. Os ventos, em particular, as monções, facilitaram as rotas e interações.

Mares e ventos, com todo o secretíssimo que os tipificam e com os misticismos que os rodeiam, são a base de uma sociedade de conhecimento, ancestral, porém eficaz e perene. Portanto, mesmo que não conheçamos a Índia física, a conhecemos de forma cultural, nutricional, espiritual e comercial. Conhecemos a Índia como nos conhecemos a nós mesmos e, só os indianos, conseguem falar, com tanta fluência, as nossas próprias línguas.

Moçambique representa a sexta maior diáspora indiana no mundo, com cerca de vinte e cinco mil (25.000) cidadãos de origem indiana residentes no interior e litoral do país.

Este longo percurso respalda as actuais relações diplomáticas, comercias, formação e de cooperação entre os dois povos e países. Os povos indianos aqui residentes, não serão, jamais, tidos como uma diáspora, mas como uma extensão das restantes comunidades que aqui se instalaram e constituem a matriz étnica, cultural e racial moçambicana. Só em 2016 a Índia investiu cerca de dois biliões de dólares, colocando-se como o terceiro maior parceiro de exportação de Moçambique e, sétimo maior parceiro de importação.

Moçambique e Índia também se associaram a duas questões estratégicas na actualidade. Em primeiro lugar a questão demográfica e, em segundo lugar as mudanças climáticas. Estes são os desafios da actualidade, pois, as economias, num período de grandes mudanças tecnológicas, precisam de se adaptar. A estabilidade social dos nossos povos e países, depende da melhoria das condições sociais e, do bem-estar dos jovens e dos nossos povos.

Neste período caracterizado pela constitucionalização da ordem global, a Índia também nos ensina a manejar as ferramentas da interdependência, multilateralismo, cooperação regional e Internacionais. Tudo sem clichés. Tira o maior proveito da ciência, não apenas para a governação, mas e principalmente, para a própria segurança nacional e bem-estar societário.

No final, Taj Mahal, esse majestoso mausoléu, localizado na cidade de Agra, foi construído em mármore branco, entre os anos de 1630 e 1652. Neste período mais fresco recebe mais de 50000 visitantes diários.

Todos ganham desse turismo de grande intensidade e baixo rendimento. Porém, ganham mais ainda os intermédios. Esse segmento que fica alheio a tudo e todos e encaixa receitas fabulosas.

Neste pós-neoliberalismo, sobrevivem os visionários e audazes. Porém, só se tornam eternos, os que amam o próximo, seus familiares e seus povos. As monções carregam amor e os amores são sinónimos de novos tempos.

categoria: maravilhas humanas

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Outras maravilhas humanas

Mércia de lutas e sonhos – por Jorge Ferrão

Quando o dia terminar e, o sol tropical não tiver mais cores para projectar, na imensidão de todas as superficies e montanhas , nos lagos e baías, nas florestas e nos Palmares, não nascerá somente um novo dia, mas a vontade de lutar e vencer de quem faz da vida uma bandeira, do estudo um trunfo, das oportunidades um espelho. Gostaria de ter dito estas e outras palavras a Mércia. Jovem menina da UP Maxixe, estudante de leis e interpretações jurídicas, que acredita em Deus e, entende que Deus jamais escreve torto por linhas direitas  ou ,igualmente, torto em linhas tortas.

Ninguém é perfeito. Frase secular que, nem por isso,  revela o tamanho da perfeição. Existem milhões de pessoas que não tendo deficiência, alguma e aparente, possuem outras deformações. Mas, existem os que tendo uma deficiência, sequer são notados e parece viverem sem nenhuma. Vivem como batalhadores e, se auto- superam a cada dia e minuto de suas vidas. Vivem como se o dia fosse o último e só sabem fazer bem e assertivamente!

Mércia , essa jovem estudante natural da Massinga e estudante de Direito, nossa estudante, já no quarto ano e com metas bem definidas, veio para o mundo sem os braços. Complicações congênitas. Nunca se intimidou e, vitoriosa, escreveu sua própria trajetória. Agradece a Deus pela graça e dom da vida e, supera as adversidades, como se a vida não tivesse obstáculos.

Trato fácil, sorriso desmedido, franzina,  e caprichosamente questionante, Mércia nos ensina que os sonhos não tem limites, que os atributos mais nobres serão sempre o carisma, a inteligência e o charme. Fala de tudo um pouco, quer visitar a Itália, aprender italiano, trabalhar e ajudar outras crianças para que a educação inclusiva seja educação e não projecto. Mércia quer ser solidária e activista de causas. Solidarizar o natal de todos os meninos e, como recompensa, apenas quer um sorriso.

Conviver com um estudante, faz de nós aprendizes. Com dois estudantes, nos transforma em seus admiradores, porém vivenciar e testemunhar o percurso de perto de 60 mil estudantes, de todas as origens e desejos, nos transforma em verdadeiros seguidores.  Caçadores de talentos e profecias. Dos meus estudantes eu aprendo, a cada dia, muito mais que o sentido hermenêutico das palavras, mas o valor das suas ações, o fascínio dos seus sonhos e o delírio das suas convicções. Vivo nesta escola cujo sumário parece ser o mesmo, porém, o recital nunca se faz com o mesmo refrão.

Por estes dias vivi, com intensidade as graduações e as vontades de triunfo, de buscar, de trabalho, de afirmação profissional. Escutei juramentos e centenas de recados. Jovens de um país, onde 60% da população tem menos de 25 anos de vida. Intelectuais que travam uma luta tenáz contra as oportunidades e as tecnologias. Mércia, Foi das que mais me impressionou. Entendo, também, que o Chefe de Estado a tenha visitado na sua própria residência e oferecido um laptop, que ela usa com orgulho. Aliás, Mércia dispensa apresentações, mas, acredito, que conhecemos uma jovem de Facebook e não de alma, uma lindíssima menina de notas brilhantes, mas desconhecemos a profundeza do seu talento.

Os livros nos ensinam o sentido da idade, razão, identidade e o mundo. Não podem ensinar tudo. A experiência e o tempo são outros professores. Livros e vida combinados são imbatíveis gestores da nossa trajetória! Estou grato pelo que pude apreender da Mércia. Ela já é um símbolo incontornável da UP, mas, breve, será esse mesmo símbolo para os jovens da sua idade e com as deficiências das quais padecem! Mércia será a líder do passado que quisemos construir, do presente que ajudamos a transformar, e desse futuro de sonhos e realizações e de lutas e sonhos realizáveis!

Texto de Jorge Ferrão